Amândio Costa, coordenador técnico do Atletismo no Boavista Futebol Clube
O Boavista Futebol Clube é muito mais do que futebol. O seu ecletismo sempre foi marca identitária, com modalidades que, ao longo de mais de um século, têm feito crescer a mística axadrezada. Uma dessas modalidades é o atletismo, que carrega não só uma longa tradição dentro do clube desde 1910 como também um papel formativo e humano de enorme relevância.
Amândio Costa, é Coordenador Técnico, que diariamente trabalha para manter viva esta modalidade no Boavista Futebol Clube, formando atletas e pessoas, dentro e fora da pista. Nesta entrevista, partilha connosco a importância do atletismo para o Clube, os métodos de treino, os desafios de formar jovens, o papel das famílias e os grandes objetivos para o futuro.
Uma conversa inspiradora sobre paixão, disciplina, superação e o orgulho de vestir a camisola axadrezada.
1. Como descreve a importância do atletismo dentro do Boavista Futebol Clube, um clube tão associado ao futebol?
O Boavista é reconhecido sobretudo pelo futebol, é verdade, mas o clube sempre foi reconhecido pelo seu ecletismo. O atletismo é, sem dúvida, uma das modalidades que mais representa o espírito universal do desporto. Recorde-se que o Atletismo no Boavista FC, teve início ainda no século XX, no ano de 1910, tendo-se realizado a primeira corrida no dia 11 de abril desse ano, na inauguração do antigo Estádio do Bessa, sendo uma das modalidades mais antigas do Clube. O Boavista Futebol Clube, foi um dos clubes fundadores da Federação Portuguesa de Atletismo, a 5 de novembro de 1921. O atletismo é a base da maioria das modalidades desportivas: correr, saltar e lançar, são movimentos fundamentais que depois se refletem noutros desportos. No Boavista, trabalhamos para que o atletismo não seja visto apenas como uma modalidade, mas também como uma escola de formação desportiva e humana. Queremos formar campeões, sim, mas acima de tudo pessoas disciplinadas, resilientes e com valores. Treinar no Boavista, significa carregar uma identidade forte, a mística axadrezada e isso é um orgulho que acompanha cada treino e cada competição.
2. Como é feita a identificação e captação de novos talentos para o atletismo do clube?
O principal meio de captação de novos atletas é através das redes sociais, em provas do desporto escolar, através do passa a palavra e traz um amigo. Muitas vezes, um jovem descobre o atletismo connosco quase por acaso, e o talento vem ao de cima com o treino adequado.
3. Como organiza o treino dos atletas?
O treino é sempre estruturado em função da idade, do nível de experiência e da disciplina que cada atleta pratica. Nos escalões de formação, damos grande enfoque ao trabalho multilateral. Ou seja, não especializamos os jovens demasiado cedo; preferimos que tenham contacto com as várias disciplinas para um bom desenvolvimento das capacidades motoras. Só mais tarde é que se especializam para a disciplina para a qual têm maior aptidão. Nos escalões mais avançados, a preparação torna-se mais rigorosa e detalhada. Cada atleta, em conjunto com o treinador, define os objetivos individuais e coletivos da época. A partir daí, é feita uma planificação de dupla periodização para as épocas de inverno (corta-mato e pista coberta) e verão (estrada e pista ao ar livre), onde são elaborados planos mensais, por atleta e disciplina, utilizando a metodologia mais adequada. O objetivo principal é a obtenção da forma para as competições mais importantes. Para além dos treinos de pista e estrada, há um grande investimento em preparação física no ginásio, prevenção de lesões e até acompanhamento nutricional e psicológico.
4. Quais são os maiores desafios de treinar jovens atletas?
São vários. Em primeiro lugar, a gestão da motivação. Vivemos numa sociedade onde os jovens têm cada vez mais distrações como as redes sociais, videojogos, pressões escolares; e manter o foco no treino exige criatividade. É preciso equilibrar rigor com prazer. Os treinos devem ser desafiantes, mas também estimulantes, para que não se tornem uma obrigação pesada. Outro desafio são as fases de crescimento. O corpo de um adolescente está em constante transformação, e isso influencia a coordenação motora, a força e até a predisposição para treinar. Temos de ter muito cuidado para não queimar etapas. Por fim, existe a questão dos resultados: muitos jovens querem vitórias rápidas, mas o atletismo, é uma modalidade de paciência. Ensinar-lhes a valorizar pequenas evoluções, como baixar alguns segundos num tempo ou melhorar a técnica de salto, é essencial para que não desistam cedo demais.
5. Qual tem sido o impacto da participação dos atletas do Boavista FC em competições nacionais e internacionais?
A participação do Boavista FC em competições nacionais e internacionais, eleva o nome do clube, promove o desenvolvimento técnico, humano e social dos atletas, e serve como um importante estímulo competitivo e ferramenta de formação, incluindo a possibilidade de atletas serem convocados para seleções nacionais. Temos tido vários atletas com centenas de títulos regionais, dezenas de títulos nacionais, participações em campeonatos europeus, nos Jogos Olímpicos da Juventude, e sempre com lugares de destaque, algo que nos agrada e transcreve um pouco o trabalho que é realizado no Clube.
6. E quanto às competições? Quais são os objetivos principais do Boavista FC no atletismo?
O Boavista compete em várias frentes: desde provas regionais até aos campeonatos nacionais. O nosso grande objetivo, é ter sempre atletas a representar o clube ao mais alto nível nacional e internacional, com convocatórias para as seleções regionais e nacionais. No entanto, a verdade é que não vivemos apenas de medalhas. Para nós, o sucesso encontramos também quando vemos um atleta bater o seu recorde pessoal, manter-se ativo no desporto e crescer como indivíduo. Claro que ambicionamos títulos e lugares no pódio, e felizmente temos conseguido muitos, mas valorizamos imensamente a progressão individual. O objetivo é criar um ambiente motivador e de apoio mútuo, onde os atletas se beneficiam de maior comprometimento, socialização, diversão e um senso de comunidade, que além de aprimorar a saúde física, também melhora o bem-estar mental e a qualidade de vida.
7. Que papel têm as famílias no sucesso e na continuidade dos jovens atletas no atletismo?
A família é o pilar fundamental para o sucesso do atleta, pois desempenham um papel fundamental no sucesso e na continuidade dos jovens atletas, oferecendo apoio emocional e prático, fomentando valores como resiliência e trabalho em equipa, e servindo como uma rede de incentivo essencial. Contudo, esse apoio deve ser equilibrado, evitando a pressão excessiva, a exigência desmedida e a imposição de expectativas, o que pode gerar ansiedade e levar à desistência do desporto. A comunicação eficaz entre família, atleta e treinador, assim como o respeito pela autonomia da criança, são cruciais para uma experiência desportiva positiva. No atletismo do nosso Clube, existe uma grande empatia entre pais, atletas, treinadores e o sucesso dos atletas, é fruto da relação desta grande família axadrezada.
8. De que forma o clube apoia os atletas que pretendem conciliar o desporto com os estudos?
A secção de atletismo apoia a conciliação entre desporto e estudos através da criação de sinergias entre família, escola e atleta, um acompanhamento escolar e social contínuo, e a delineação de estratégias de apoio para reduzir o insucesso e o abandono escolar. Esta colaboração garante que as necessidades académicas e desportivas dos jovens são satisfeitas, promovendo um desenvolvimento integral. A família, a escola e o clube trabalham em conjunto, partilhando informações e responsabilidades para apoiar o desenvolvimento dos jovens atletas. O clube mantém um registo atualizado do progresso escolar dos atletas para identificar rapidamente a necessidade de intervenção e atuar em conjunto com a escola e os pais, onde são definidas estratégias para garantir que os atletas não comprometam a sua educação, seja através da redução de carga horária ou da adaptação a horários. A importância da formação académica é reconhecida, com o objetivo de formar não só melhores atletas, mas também melhores alunos e futuros adultos conscientes. A prioridade é sempre a formação académica com vista à construção de um futuro promissor. O esforço investido nos estudos vale sempre a pena.
9. Que conselho deixaria a um jovem que está a pensar começar no atletismo?
O meu primeiro conselho é experimenta,
O atletismo é uma modalidade tão diversa que quase todos encontram uma disciplina que podem praticar. Não importa se és rápido, resistente, alto, baixo, forte ou ágil, sempre há uma disciplina que pode encaixar no teu perfil.
O segundo conselho é paciência,
Esta modalidade não dá resultados imediatos, é preciso trabalhar muito até ver progressos, mas essa paciência compensa, porque cada evolução, por mais pequena que seja, é uma conquista pessoal enorme.
O terceiro conselho é compromisso,
Um atleta que seja consistente e resiliente, assíduo aos treinos, empenhado nos seus objetivos, terá um progresso inevitável e o sucesso pode ser alcançado.
10. Quais são os objetivos mais ambiciosos do Boavista para as próximas épocas nesta modalidade?
Temos vários objetivos pela frente. O primeiro é continuar a reforçar a nossa formação, captando mais jovens atletas e dar-lhes condições para crescerem dentro da modalidade. E, claro, o nosso grande sonho é voltar a ter atletas formados no Boavista nos Jogos Olímpicos. Isso seria o coroar de um trabalho de equipa que envolve treinadores, dirigentes, atletas e famílias.
Pessoalmente, treinar no Boavista Futebol Clube é um enorme orgulho, é sentir todos os dias o peso de uma camisola histórica e, ao mesmo tempo, a responsabilidade de escrever novas páginas na história do Clube através do atletismo.
Obrigado, Amândio Costa
Vamos Pantera!
